POR MARI MONTEIRO
PROGRESSÃO CONTINUADA. Eis um assunto que sempre trago à
tona. Principalmente, quando chegam às minhas mãos atividades, no caso de
Língua Portuguesa, relacionadas a alunos com muita dificuldade de aprendizagem.
As atividades que vi hoje consistem em alguns ditados e escritas espontâneas de
dois alunos de 5º ano. Eu escrevi 5º ano!!! Nestas atividades, os alunos,
literalmente, apenas escreveram o próprio nome. As demais escritas eram
ilegíveis. Porém, “DEDUZÍVEIS”! E, em minha opinião, é JUSTAMENTE NO FATO DE O
PROFESSOR DEDUZIR O QUE ESTÁ ESCRITO É QUE ERRAMOS! E ERRAMOS FEIO! Seguem outras atividade de sondagem (é assim que chamam o procedimento "incansável" de verificar se o aluno evoluiu ou não - com ditado de palavras e frases!). ESTAS ATIVIDADES TAMBÉM SÃO DE ALUNOS QUE ESTÃO NO 5º ANO!!!
Já disse isso em outras ocasiões. Não se trata de encontrar culpados; mas que eles existem, EXISTEM! Penso que, no exato momento em que foi colocada a expressão “PROGRESSÃO CONTINUADA”, ela soou bem, nos pareceu algo positivo; afinal, pensamos: “quem não quer progredir continuamente”? Eu até acredito na BOA INTENÇÃO DE TODOS. Mas, ao começarmos a ADIVINHAR O QUE ESTAVA ESCRITO NAS ATIVIDADES DOS ALUNOS QUE NÃO SABIAM ESCREVER, começamos também a traçar uma trajetória de fracassos relacionados ao aprendizado real e à possibilidade de continuidade nos estudos.
Daí surgiu a FAMIGERADA classificação (e não me importo com
possíveis xingamentos de alguns colegas docentes, conheço profissionais que
DEFENDEM de forma ferrenha esta “avaliação”) na qual os alunos são
“classificados” em: alfabéticos; silábicos; silábicos sem valor; silábicos com
valor; pré-silábicos... Depois disso,
percebi que estava tudo acabado. ADEUS EDUCAÇÃO DE QUALIDADE! Não sei
exatamente há quantos anos a Progressão Continuada vem sendo praticada no
Brasil. O que sei é isso NÃO MELHOROU EM NADA A QUALIDADE DA NOSSA EDUCAÇÃO.
Caso contrário, o Brasil não ocuparia uma posição tão vergonhosa no Ranking
Mundial de Educação.
http://www.cartacapital.com.br/educacao/brasil-e-60o-de-76-paises-em-ranking-de-educacao-8400.html
Sempre me posicionei de forma muito objetiva quanto a
referida forma de classificação que, para mim, nada mais é do que uma forma
“rebuscada” de justificar QUALQUER
MÍNIMO SUPOSTO AVANÇO que o aluno tenha de um bimestre para outro para
APROVÁ-LO, sob o pretexto de que ele EVOLUIU. E meus questionamentos sempre
foram:
- Evoluiu ao ponto de ser aprovado E ACOMPANHAR OS CONTEÚDOS
da série seguinte?
- Até que ponto aprovar o aluno que NÃO SABE é positivo pra
ele?
- Como será a continuidade do trabalho pedagógico do
professor da série seguinte? Ele também ficará ADIVINHANDO O QUE O ALUNO ESCREVE
e, com base nisso, decidirá se ele “passou de fase”, ganhou “vida extra” ou foi
game over?
- Há quem defenda que o aluno não pode repetir, pois se
sentirá excluído e marginalizado. Pra essas pessoas, eu pergunto: “E quem (e o que)
impedirá que ele se sinta excluído e marginalizado numa sala de sexto ano
consciente de que não está conseguindo acompanhar as aulas, os conteúdos, os
colegas???”. APROVAR ALUNO QUE NÃO ESTÁ APTO TAMBÉM É EXCLUIR. Apenas se adia a
exclusão.
- E, no caso do 5º ano, onde sempre atuei e discuti de forma
mais incisiva a progressão continuada, o aluno cujas leitura e escrita são completamente
deficientes e que, claro, será aprovado para o SEXTO ANO, continuará sendo
ATENDIDO E ENTENDIDO pelos professores de cada área?
Sobre este último questionamento, sempre soube a resposta,
porque atuei também no Fundamental II e no Ensino Médio. A resposta é: NÃO. ELE NÃO SERÁ ATENDIDO E
ENTENDIDO e, muito menos, tratado como foi no Fundamental I. E os motivos são
óbvios e até justos:
- subentende-se que se o aluno está no sexto ano,
minimamente, ele escreve com autonomia e lê com uma fluência suficiente para
dar conta do aprendizado dos conteúdos;
- a dinâmica de ensino é outra, muitos professores, mais
matérias e cada professor com sua “metodologia”;
- cada professor possui um número mais elevado de alunos (tanto por sala como no total de sua turmas/séries).
Eu disse que os motivos são óbvios. Tão óbvios que, mesmo
por isso, até podem passar despercebidos (quero crer) por aqueles que aprovam
os alunos sem as devidas condições. Soma-se a isso a necessidade de PONDERAR
SOBRE COMO O ALUNO COM DIFICULDADE SE SENTIRÁ NO GRUPO. Ou seja, o provável
aumento das dificuldades de aprendizagem minará sua autoestima e sua segurança.
Uma vez inseguro e sentindo-se incapaz, a evasão é apenas uma questão de tempo.
Aqui cabe uma ilustração, mais que isso, um fato que ocorreu
no primeiro dia em que voltei pra escola neste semestre. Reencontrei uma aluna
que não via há uns sete anos. Estava no portão da escola e ela chegou com sua
mãe e foi logo me abraçando e dizendo: “Prô, que saudade!”. Não fosse esta
frase, talvez eu não entendesse nada. Ela está muito diferente. Uma moça alta,
maquiada, de salto alto. Foi minha aluna no ano 5º ano (APROVADA PELO CONSELHO COM
RECOMENDAÇÃO DE REFORÇO NA SÉRIE POSTERIOR – balela, nunca encontrei nenhum
aluno com dificuldade no Fundamental II, que
estivesse tendo reforço.). Conforme a gente foi se falando, depois de
alguns segundos, já me lembrava até do lugar em que ela se sentava na sala. E,
eu com minha mania de acreditar sempre no melhor, fiz a pergunta clichê: “ E
então, está terminando o Ensino Médio?”... Silêncio! A mãe se apressou em
dizer: “Nada professora, ela largou de mão os estudo (sic).” “Oi? Como assim
criatura?” – Ninguém estranha, sempre foi meu jeito de falar com todos meus
alunos. A mãe se apressou em explicar já que a moça abaixou a cabeça
constrangida.
- Ela deixou no sexto ano professora. Foi mais não. Agora a
gente veio fazer a inscrição pra ela terminar os estudos, pra poder trabalhar.
“Entendi. Faz bem.” Disse eu à mãe, me lembrando de uma
faixa da EJA (Educação de Jovens e de Adultos) em frente á escola informando os
prazos de inscrição para os cursos.
Alguns (talvez muitos), EQUIVOCADAMENTE, que sou favorável à
reprovação. Para constar, deixo claro o seguinte: não acredito em uma educação
que permite que o aluno “saia” do 3º ano do Ensino Fundamental I sem saber ler
e escrever. Surgiu há pouco, não sei precisar agora, o PACTO NACIONAL PELA
ALFABETIZAÇÃO NA IDADE CERTA (ver mais no link: http://pacto.mec.gov.br/component/content/article/2-uncategorised/53-entendento-o-pacto ), que é quando? Aos oito anos de
idade. Bingo! Eu nunca estive de tudo errada. Sou a favor de uma APROVAÇÃO
CONSCIENTE E REAL, inclusive para os pais, eles merecem saber o que o aluno
sabe ou não e a QUALIDADE do que ele
sabe. Logo, entre aprovar um aluno sem saber ou reprová-lo para que ele, no
mínimo, continue contando com um atendimento mais individualizado e com
possibilidades de reforço efetivo, eu reprovaria sem a menor culpa.
Enfim, este é um assunto para infindáveis páginas e
discussões. Por ora, ficarei por aqui frustrada com as constatações de um
fracasso escolar que, acredito, ganhou “forças” com a tal progressão continuada que, na verdade,
não oportuniza nenhum progresso; ao contrário, ficamos (professores e alunos)
andando em círculos ou, pior, REGREDINDO. Visualizar esta situação pode ser mais fácil
do que parece. COLOQUE-SE NO LUGAR DE ALGUÉM QUE NÃO ESTÁ APTO PARA PROSSEGUIR
OS ESTUDOS (para ser aprovado, é assim que aparecem na documentação), pense
como você (ou um filho seu) se sentiria quando os professores do 6º ano
dissessem coisas do tipo: “Abram as apostilas e leiam a página 32.”
(considerando que você também será convidado a ler); “Agora produzam um texto a
partir do tema escrito na lousa para ser entregue no final desta aula”...
Pensou? Visualizou o que faria nas situações colocadas? Gostou da sensação?
Então. É isso. Caso tenha gostado ou ficado indiferente, lamento sua falta de
sensibilidade. Agora, se algo te deixou desconfortável, repense a progressão
automática. Ou melhor, pensemos juntos sobre o que ela “PROMOVE”.
Nenhum comentário:
Postar um comentário